Fim de abril e eu havia retornado de uma viagem aos Estados Unidos chamado a conhecer experiências exitosas de governos locais, incluindo um encontro com o jovem governador de cara rechonchuda do distante Arkansas, Bill Clinton, quando tocou o telefone. Maurilio Ferreira Lima chegou ao meu apartamento no dia seguinte, uma terça-feira, acompanhado de Jarbas Vasconcelos, o qual até então eu nunca havia encontrado. A conversa evoluiu por cerca de uma hora. Do décimo andar do Edifício Olimpíadas, no Parnamirim, víamos os morros de Casa Amarela e de Olinda mais ao fundo. Segui a rotina de Coordenador do Mestrado em Ciência Política da UFPE, nomeado pelo reitor George Browne após o período como Visiting Scholar em Berkeley, Califórnia.

No sábado, convidado para Conselheiro do recém-criado “Centro Debate”, que seria de fato o QG da marcha à prefeitura, cheguei lá às nove horas da manhã. Não tinha ideia de como minha vida mudaria a partir daquele instante. O ano era 1985. A Nova República estava nascendo. Tancredo Neves se fora e o presidente Sarney em busca da legitimidade convocara eleições para as capitais e municípios de segurança nacional. O Recife ia resgatar sua autonomia.
Fui atraído para o turbilhão da campanha, passando a conviver de perto com o estado-maior responsável pela sua operação – Edgar Moury, Marcos Cunha e Carlos Eduardo Cadoca. E vez por outra, a convite do candidato, me relacionando com os principais apoiadores: Miguel Arraes, Pelópidas Silveira, Egídio Ferreira Lima e o ministro Fernando Lyra.
O debate funcionava numa casa pequena, de poucos cômodos, completada por um auditório sem luz natural. Lá dentro o frenesi constante de um exército de militantes dos mais diversos matizes. Logo mais começaria a propaganda na TV, onde Ivan Maurício fez milagres no pouquíssimo tempo disponível, ao som do jingle inesquecível criado por Joca Souza Leão. Depois dos comícios embalados por Reginaldo Rossi não raro as avaliações continuavam no Mourisco, anfitrionadas por Zinho Correia.
A vitória para muitos surpreendente de Jarbas viria inaugurar um MBA de políticas públicas, do qual ele foi maestro e nós partícipes ativos. Pela primeira, vez após 21 anos uma geração alijada de cargos de comando pela ditadura, assumia protagonismo na capital mais emblemática do Nordeste. Começava um exercício de prática e aprendizado a um só tempo para egressos, alguns como eu da academia, outros dos movimentos sociais, culturais e de entidades representativas, além dos experimentados na política parlamentar.
Sobressaem na minha memória Edla Soares, Jaime Gusmão, João Braga, José Arlindo Soares, João Roberto Peixe, João Humberto Martorelli, José Carlos Guerra, João Negromonte, Lúcia Pontes, Sydia Maranhão, Cláudio Marinho, Teógenes Leitão, Silvia Pontual, Fernando Correia, Homero Fonseca , Anatólio Julião, Jorge Martins, Silvio Pessoa, Eduardo Pandolfi , Leda Alves e Raul Henry, o mais jovem chefe de gabinete do país. Uma turma de “alunos” de formação e idades diferentes, selecionados pela notável intuição do prefeito que os coordenava. Ele próprio aprendendo enquanto passava de jogador a técnico. Não por acaso os técnicos também são chamados de “professor”.
Em meio a esse time eu, um “observador participante”, pude cursar uma autêntica pós-graduação em gestão pública. Como único Assessor Especial, era envolvido e aprendia interagindo com a equipe ultra talentosa sobre temas do atacado ao varejo das diversas áreas da administração. Experiência ainda enriquecida enquanto o ajudava na convivência das Frentes de Prefeitos. Primeiro das capitais do Nordeste, criada por ele, depois do Brasil. E no acompanhamento das atividades da Constituinte pelo Instituto da Cidade do Recife que também me coube secretariar, conveniado com a Funarte do governo federal, dirigida pelo amigo comum Joaquim Falcão, onde além de possibilitarmos o acesso diário da população a toda sua documentação, fizemos audiências públicas no Teatro Santa Isabel lotado, com parlamentares entre os quais Mário Covas, líder do PMDB e Cristina Tavares.
A “Turma de 1985” brilhou no mandato relâmpago – três anos sem direito à reeleição – fazendo após duas décadas a primeira governação democrática da cidade. E foi aprovada com louvor. Em todas as pesquisas do Datafolha Jarbas ocupou o primeiro lugar nas capitais. Com essa experiência e reconhecimento, mestre e alunos cresceram, galgando a partir daí posições de cada vez maior responsabilidade e prestígio na cidade, no estado e no país.

*Cientista político, sociólogo, advogado e jornalista

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