Governador é acusado de acumular fortuna de R$ 39 milhões, enquanto servidor viveu sem salário
Da pacata Piraí, onde curtia atividades na praça, até morar no Palácio Laranjeiras, Pezão acumulou fortuna ilícita, segundo investigações da Polícia Federal (Ernesto Carriço/Agência O Dia)
Da pacata Piraí, onde curtia atividades na praça, até morar no Palácio Laranjeiras, Pezão acumulou fortuna ilícita, segundo investigações da Polícia Federal (Ernesto Carriço/Agência O Dia)
Por Luana Dandara *

 

Filho de torneiro mecânico e dona de casa, Luiz Fernando de Souza, conhecido como Pezão, experimentou acentuada mudança em sua vida desde 1982, quando, com 27 anos, se elegeu vereador na pacata cidade de Piraí, no Sul Fluminense. Naquela época, era comum vê-lo na Praça de Santana tomando cerveja e petiscando torresmo ou jogando cartas com os amigos. De lá pra cá, a ascensão foi grande. Foi prefeito do lugar por duas vezes e em 2014 tornou-se governador do Rio, após dois mandatos como vice de Sérgio Cabral (MDB). Hoje, Pezão está preso no Batalhão Especial Prisional de Niterói (BEP) sob acusação de receber propinas de R$ 39 milhões.

Enquanto a conta bancária do político aumentava substancialmente, a de vários cidadãos fluminenses mergulhava no vermelho. “Precisei pegar sete empréstimos e comecei a costurar e vender roupas, porque até papel higiênico faltou em casa”, conta Natalina Conceição, uma das milhares de funcionárias públicas prejudicadas pela administração do governador Pezão.

Na época em que ele circulava com tranquilidade por Piraí e ainda não lidava com milhões, a servidora, de 62 anos, tinha dinheiro suficiente para fazer viagens anuais com a família a estados como Paraná e Bahia. Mas há três anos começou o atraso e parcelamento dos salários. Depois de ficar até dois meses sem receber o pagamento no ano passado, Natalina teve um rombo nas contas e modificou a rotina. “O dinheiro não dava nem pra ir a Japeri. Ao mesmo tempo que o meu aluguel, água e luz atrasavam, o Pezão recebia a propina”, conclui ela após a prisão. Ela tem quatro filhos, todos bombeiros, e seis netos. “Estamos ainda em uma corda bamba, sofrendo para pagar as dívidas. O que vendo das roupas vai para os juros do cartão de crédito”, acrescenta.

Desde 2015, a situação no Rio ficou tão ruim que o governo decretou estado de calamidade financeira. Servidores, sem salário, contaram com campanhas de distribuição de alimentos. Serviços básicos foram prejudicados. Segundo a Polícia Federal, até um ano antes desse caos, Pezão ainda recebia a sua “mesada”, que dava direito até a 13º salário e bônus.

Na casa, em Nova Iguaçu, a função de costureira, com que Natalina Conceição tenta equilibrar as contas, rende a ela R$ 800 ao mês, uma quantia bem abaixo dos R$ 150 mil mensais que, de acordo com as investigações, transformaram Pezão, um homem classe média baixa, em um milionário hóspede do Palácio Laranjeiras.

Policial militar ainda está no vermelho

Desde 2016, quando o padrinho político e antecessor Sérgio Cabral foi preso, Pezão viu diversos aliados do esquema de corrupção serem detidos. Simultaneamente, na Polícia Militar, cabo L., chegou a perder amigos que não suportaram a penúria financeira. “Foram diversos atrasos de pagamento e nenhum benefício salarial. Até hoje pago juros de cheque especial, porque financiei minha casa e não pode haver atrasos. O policial já sofre com a Segurança do estado, para piorar não temos tranquilidade em casa com as contas”, conta ele, que tem dois filhos ainda crianças.

Em meio à crise, o governador teve que se afastar devido a um câncer, curado em quatro meses. Já a auxiliar de enfermagem do Hospital Estadual Eduardo Rabello Márcia Regina, de 53 anos, não teve a rapidez em seu tratamento contra a depressão e os companheiros de trabalho tiveram de fazer ‘vaquinha’ para seus remédios. “A doença voltou no momento dos protestos dos servidores. O Pezão curtia bons restaurantes, carro e roupas. Aqui em casa nem carne e leite tinha”, lembra.

* Estagiária sob a supervisão do jornalista Chico Alves

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