Autor: Chico Sant’Anna

Para o Ministério Público Federal, que foi o autor da representação no STF, a alteração feita pela CLDF permitiria a utilização dos meios oficiais de publicidade institucional da Câmara Legislativa ou dos órgãos da administração pública distrital para a promoção pessoal indevida de agentes políticos ou autoridades

Por Chico Sant’Anna, com base na Ascom STF

O Supremo Tribunal Federal acabou com uma mamata criada pela Câmara Legislativa do DF com as benções do governador Ibaneis Rocha. E foi por goleada: 11 a zero. O STF considerou inconstitucional uma emenda à Lei Orgânica do DF que permitia o uso de verbas públicas para publicidade personalizada, sob o manto da prestação de contas à opinião pública. Como é sabido, a Constituição Federal proíbe essa prática, mas suas excelências resolveram mudar na CLDF a Constituição Federal. Imaginavam que alterando a Lei Orgânica do DF ficariam imunes às penalizações previstas na lei maior. Para 2021, o GDF alocou R$ 160 milhões para gastar com publicidade e propaganda e a Câmara Legislativa, R$ 40,950 milhões. Parlamentar ou gestor do GDF que for processado por propaganda personalizada poderá ser enquadrado em improbidade administrativa, perda do mandato, se for parlamentar; e inegibilidade.

O que o STF decidiu foi tornar sem efeito a Emenda 114/2019 que introduziu os parágrafos 5º e 6º do artigo 22 da LODF. O primeiro dispositivo estabelecia que a divulgação feita por autoridade de ato, programa, obra ou serviço públicos de sua iniciativa não caracteriza promoção pessoal, quando atende os critérios previstos em norma interna de cada Poder. O segundo tinha previsão semelhante em relação à inclusão, em material de divulgação parlamentar, do nome do autor da iniciativa do ato, programa, obra ou serviço públicos, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual.

Ou seja, suas excelências queriam que a divulgação de seus nomes ou mesmo imagens fossem consideradas legais, mesmo que pagas com recursos públicos. O texto integral dos dois parágrafos é o seguinte:

§ 5º A divulgação feita por autoridade de ato, programa, obra ou serviço públicos de sua iniciativa, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual, não caracteriza promoção pessoal, quando atenda os critérios previstos em norma interna de cada poder.

§ 6º Também não caracteriza promoção pessoal a inclusão em material de divulgação parlamentar do nome do autor que teve a iniciativa do ato, programa, obra ou serviço públicos, incluídos os decorrentes de emendas à lei orçamentária anual.

Emenda à LODF

O projeto de Emenda à Lei Orgânica nº 15/2019 data de 1º de agosto de 2019 e teve vários parlamentares como autores. Curiosamente, hoje os nomes deles não são divulgados. Nesse caso parece que preferiram o anonimato. Mas uma pesquisa mais aprofundada, permitiu descobrir que o projeto foi ideia de dez dos 24 distritais: Rafael Prudente (MDB), presidente da CLDF; Rodrigo Delmasso (Republicanos), vice presidente da CLDF; Iolando Almeida (PSC), Daniel Donizete (PL), Jorge Vianna (Podemos), Claudio Abrantes e Professor Reginaldo Veras, ambos do PDT, Chico Vigilante (PT), Leandro Grass (Rede), e Telma Rufino (PSB).

A votação em primeiro turno se deu em 6 de agosto daquele ano. Três distritais não estavam na sessão e 21, dos 24 distritais, votaram favoravelmente à emenda à Lei Orgânica. O segundo turno se deu em 3 de setembro de 2019 e a emenda recebeu o voto Sim de 18 distritais. Seis não estavam em plenário (Vide ilustração para ver como votaram os distritais). Posteriormente, a emenda foi sancionada pelo governador Ibaneis Rocha (MDB).

Promoção pessoal

Para o Ministério Público Federal, que foi o autor da representação no STF, a alteração permite a utilização dos meios oficiais de publicidade institucional da Câmara Legislativa ou dos órgãos da administração pública distrital para a promoção pessoal indevida de agentes políticos ou autoridades. O MPF também apontou inconstitucionalidade na previsão de que a “norma interna de cada poder” afaste antecipadamente a caracterização de condutas como promoção pessoal em atos de divulgação praticados por autoridades.

Relatora da ação, a ministra Carmen Lúcia decidiu que nenhuma publicidade ou campanha do poder público pode ter como objetivo a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos e veda divulgações ou campanhas que veiculem nomes, símbolos ou imagens com essa finalidade.

Esse blog sistematicamente aponta irregularidades desse tipo por parte de titulares de cargos públicos, notadamente, administradores regionais que se valem das estruturas e plataformas governamentais para se auto promoverem, sob o manto da prestação de contas.

Segundo o procurador-geral da República, Augusto Aras, os dispositivos questionados desvirtuam o caráter informativo, educativo e orientador da publicidade governamental. Posto que, é vedado a sua utilização para a promoção pessoal de autoridades públicas, conforme assenta os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa. Para o Ministério Público Federal, o uso pessoal da publicidade institucional é incompatível com os princípios republicanos, da impessoalidade, da moralidade administrativa, da igualdade e da publicidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal.

O mesmo artigo 37 da Constituição da República foi usado pela ministra Cármen Lúcia em seu parecer. Ela destacou que nenhuma publicidade ou campanha do poder público pode ter como objetivo a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos e veda divulgações ou campanhas que veiculem nomes, símbolos ou imagens com essa finalidade.

Essa regra, segundo Carmen Lúcia, não admite flexibilização por norma infraconstitucional ou regulamentar. Em seu entendimento, o dispositivo da LODF, ao atribuir a cada Poder a edição dos critérios, abriu espaço indevido de regulamentação não previsto na Constituição da República, tornando deficiente a proteção contra eventuais desvios de finalidade. “Não cabe a órgão ou Poder fixar critérios, pressupostos ou requisitos para a incidência de norma autoaplicável da Constituição”, destacou.

Prestação de contas

Com relação aos parlamentares, Carmen Lúcia entendeu que deve ser fixada interpretação para que a divulgação de atos e iniciativas deles seja legítima apenas quando efetuada nos ambientes de divulgação do mandatário ou do partido político, sem confundi-la com a publicidade do órgão público ou da entidade.

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